sábado, 18 de julho de 2020

Projeto Inspiring Alumni - Marco Bento (Professor do Ensino Básico)



Entrevista completa em:

SEXTA, 17 JULHO, 2020
Considero determinante na minha vida a possibilidade e disposição de sempre estar a aprender e a reconfigurar-me para poder ser um melhor professor. Conviver com diferentes experiências, em diferentes Escolas de Ensino Superior, em Portugal e fora, permitiu-me contactar com outras realidades, outras pessoas, analisar diferentes visões e ir podendo construir a minha forma de pensar e criar Educação.

Marco Bento é licenciado em Ensino Básico – 1.º Ciclo pela Escola Superior de Educação de Coimbra. Tem uma Pós-graduação em TIC e um Mestrado em TIC, na especialização de Comunicação Multimédia, desde 2013.

Tem tido o reconhecimento internacional com prémios europeus, que reconhecem a melhor investigação na área das práticas pedagógicas com utilização do digital com crianças (2016) e sobre Ambientes Educativos Inovadores mediados por tecnologia (2018).

Desde 2014, tornou-se autor e responsável por diversas formações, workshops e comunicações sobre a utilização de dispositivos móveis e novos cenários de inovação pedagógica mediados por tecnologia em contexto educativo (mobile learning, ubiquitous learning, flipped learning, gamification, game based learning, project based learning, spaced learning, colaborative and cooperative learning scenarios,…).

Atualmente é investigador no Centro de Investigação em Educação (CIEd), da Universidade do Minho, estando na fase de conclusão do Doutoramento em Ciências da Educação, na especialização de Tecnologia Educativa, com um projeto financiado com uma bolsa de investigação científica atribuída pela FCT no Programa de Doutoramento Technology Enhanced Learning and Societal Challenges (TEL-SC).

Hoje, é também consultor pedagógico e assumiu desde janeiro de 2020 a Direção Pedagógica no Colégio Santa Eulália, em Santa Maria da Feira.

Faz parte de duas redes internacionais, a Rede COST- Digital Literacy Skills and Practices in the Early Years (DigiLitEY), na qual é co-investigador na ação "Competências de literacia digital e multimodalidade: práticas com crianças entre os 4 e 9 anos de idade" e a Rede Internacional de Investigação-Ação Colaborativa.

Participa ou participou em diversos projetos europeus como co-investigador: Gaming in Action, 12 Habits for Success, E-Learning course on Mobile Robotics for Adult Education: the fourth industrial revolution, Projeto FCT Rekindle+50 - Digital migrations and curricular innovation: giving new meaning to experience and rekindle teaching profession after 50, Bringing Life Into the Classroom.

Coordena desde há 4 anos o Projeto SUPERTABi (transformar as práticas pedagógicas através do uso de modelos pedagógicos centrados no aluno e mediados por tecnologias móveis, potenciando os novos espaços de aprendizagem), assim como Coordena os Encontros sobre Inovação Pedagógica SUPERTABi para discutir as três dimensões de investigação: pedagogia, tecnologia e espaço de aprendizagem.

Iniciou a sua formação como Professor do Ensino Básico em 2003 na Escola Superior de Educação de Coimbra. O que mudou no papel do professor desde 2003?

Sim, de facto terminei a minha formação inicial em 2003, trabalhei como professor contratado, durante 12 anos e o que fui experienciando e vivenciando traduziu-se em poucas alterações às dinâmicas pedagógicas. O papel do professor deveria ter mudado bastante, a sociedade evoluiu e a escola deveria liderar a inovação social e dar resposta à sociedade através das atividades pedagógicas com os alunos, mas ao invés disso, nem sequer consegue acompanhá-la. Criar projetos que os alunos desenvolvam por si, em momentos de cooperação e colaboração, tendo como meta a produção de um produto que se traduza na aplicabilidade do quotidiano, desenvolver atividades de comunicação, pensamento crítico, incluídos nas aprendizagens da literacia, numeracia e das expressões artísticas e físicas. Todos estes fatores deveriam constar num novo formato de professor. Defendo que um professor deve, hoje, conseguir interpretar o currículo e adaptá-lo ao seu público, saber flexibilizar sem ser por decreto, saber incluir em equidade e não em igualdade, dominar as dimensões pedagógicas, tecnológicas e reorganizar os espaços de aprendizagem. Essas competências farão desse professor alguém atual.

 Quais os momentos/experiências do seu percurso Académico que gostaria de destacar?

Acima de tudo o que mais saliento do meu percurso académico, numa primeira fase enquanto aluno da Escola Superior de Educação de Coimbra, foi o ambiente acolhedor que encontrei e o sentimento de pertença. As experiências de estágio ao longo dos vários anos da licenciatura foram determinantes para criar o gosto e a paixão pela Educação, mas também as amizades criadas entre professores, colegas e muitas que se mantém até hoje, já com algumas parcerias noutros projetos.

Porém, destaco o facto de não ter parado, enquanto professor, de continuar a ser aluno sempre. Considero determinante na minha vida a possibilidade e disposição de sempre estar a aprender e a reconfigurar-me para poder ser um melhor professor. Conviver com diferentes experiências, em diferentes Escolas de Ensino Superior, em Portugal e fora, permitiu-me contactar com outras realidades, outras pessoas, analisar diferentes visões e ir podendo construir a minha forma de pensar e criar Educação.

 Que sugestões daria a um estudante de Educação Básica para uma melhor integração no mercado de trabalho?

O melhor conselho que poderei dar é o de construir o maior número de experiências possíveis, desde visitar escolas e perceber que a realidade é dura e menos romanceada, mas muito mais desafiante. Conhecer desde logo esses desafios preparam-nos para uma melhor integração. Conhecer escolas de diferentes contextos, portuguesas e estrangeiras, abrem a nossa mente e forma de pensar, mas também nos confronta com o que vamos aprendendo enquanto estudantes, criam dúvidas e essas dúvidas levam-nos na procura de respostas. Frequentar eventos sobre Educação são uma excelente forma de conhecer salas de aula diferentes, ouvir as partilhas de práticas inovadoras de forma a não ficarmos presos à forma como vimos ensinar, mas criarmos a segurança de fazer diferente e por isso, tentar não ser um professor formatado pelo sistema e combatê-lo… mas só se consegue quando temos segurança e uma visão ampla sobre o mesmo.

Alguns dos seus trabalhos de investigação foram distinguidos com prémios europeus. Qual a importância que estes prémios tiveram no seu percurso profissional?

É um sinal de reconhecimento pelo trabalho realizado, desde logo do ponto de vista da investigação, mas também pela forma como nos permite criar pensamento sobre a mesma. Os prémios são resultado de um investimento na carreira de professor, que acabam por resultar no desenho e participação em novos projetos de investigação dentro do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho, mas também pela possibilidade de colaborar ativamente em redes internacionais sobre investigação em Educação ou, mais em particular, abraçar novas formas de contribuir para uma melhor educação, seja enquanto Coordenador do Projeto SUPERTABi, Diretor Pedagógico do Colégio Santa Eulália ou Coordenar Projetos de Formação Contínua de Docentes em vários pontos do país e em estreita colaboração com a Direção Geral de Educação.

Em que consiste o projeto SUPERTABi?

O Projeto SUPERTABi pretende transformar as práticas pedagógicas através do uso de modelos pedagógicos centrados no aluno e mediados por tecnologias móveis, potenciando os novos espaços de aprendizagem. Ou seja, é um projeto em que os dispositivos móveis servem de apoio a uma nova dinâmica de sala de aula e ao desenvolvimento da aprendizagem formal, não formal e informal, integrados no sistema de ensino, sobretudo na reflexão e desenho dos novos ambientes pedagógicos de aprendizagem e a sua efetiva e competente utilização. O Projeto desenvolve-se desde há 5 anos e está neste ano letivo implementado em 14 turmas, do 1.º Ciclo do Ensino Básico, dos 7 Agrupamentos de Escolas do Concelho da Maia. O desenho de todas as atividades pedagógicas é feito tendo por base três dimensões investigadas no projeto de doutoramento: Pedagogia (consideramos as diferentes pedagogias como o mobile learning/ubiquitous learning, a aprendizagem cooperativa, aprendizagem colaborativa, aprendizagem invertida, aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem baseada em jogos, gamificação, aprendizagem por narrativas digitais,...), Tecnologia (consideramos a fomentação do uso de recursos digitais, destacando as suas potencialidades para a melhoria das aprendizagem dos alunos, nomeadamente, os dispositivos móveis) e o Espaço (consideramos a redefinição dos diferentes espaços de aprendizagem, re-imaginando o espaço de aprendizagem: onde está o professor? qual é o seu papel? e os alunos? como estão os alunos dispostos para as diferentes atividades? Os espaços virtuais, os espaços exteriores, …).

É importante referir que este projeto se centra nos professores e no seu desenvolvimento profissional, com um modelo formativo anual, no qual todas as semanas temos criado um espaço “Casa do Professor SUPERTABi” de reflexão, partilha e formação, mas, que naturalmente, tem implicações no sucesso dos alunos e em todos os outros atores educativos.



Como surgiu o projeto?

O Projeto nasceu de uma investigação de Doutoramento em Ciências da Educação, na especialização em Tecnologia Educativa, no Instituto de Educação da Universidade do Minho, sobre o tema “Que fatores aumentam (ou impedem) o envolvimento dos professores na sua aprendizagem profissional sobre novas abordagens pedagógicas na era do mobile learning?”

Este projeto foi financiado pela FCT (Fundação para a Ciência e Tecnologia) numa bolsa de investigação científica que se inseriu no Programa Technology Enhanced Learning and Societal Challenges (TEL-SC), um consórcio entre as Universidades do Minho, Aveiro e Lisboa.

O Projeto iniciou-se com 2 estudos de caso. Após os primeiros resultados intercalares do projeto, o município da Maia começou a envolver todas as direções de escolas, associações de pais e, juntos, criámos um projeto municipal em que alargámos num primeiro ano a mais 7 professores e no segundo ano a outros 7, perfazendo o total de 14 atuais. Estamos neste momento a preparar o próximo ano letivo com mais 20 professores a serem preparados para esse novo contexto pedagógico. Saliento que ninguém é obrigado a participar, o projeto usa uma estratégia participativa e de disseminação por envolvimento e entusiasmo dos professores do 1.º CEB.

Considera que as escolas e os professores estavam preparados para o ensino a distância a que a realidade da pandemia os obrigou?

No caso dos professores do Projeto SUPERTABi [https://supertabi2020.blogspot.com/] foi muito mais fácil, porque existiam práticas e ambientes explorados previamente à pandemia que facilitaram a autonomia e continuidade de interação pedagógica, num ambiente virtual com alunos de 7, 8, 9 e 10 anos. Os pais também já estavam habituados a um conjunto de práticas curriculares que divergiam de um modelo centrado no professor para um modelo centrado na produção de conteúdos por parte dos alunos. O sucesso ou insucesso do ambiente online gerado pela pandemia foi determinado pelo grau de ambientação pedagógica com o digital que já existia em escolas por esse país.

Repare-se que de um momento para o outro o Ensino a Distância e, naturalmente, o uso das tecnologias digitais se tornaram uma espécie de “Novo Mundo” para o sistema educativo. É uma verdade que, para alguns de forma natural e para outros de forma mais obrigatória, porque foram obrigados a fazer uma migração rápida e pouco espontânea, levando naturalmente às “dores de crescimento” e a alguns erros naturais.

O desenvolvimento de práticas pedagógicas em ambientes mediados por tecnologia é agora uma realidade. Considera que esta situação vai alterar a aprendizagem em definitivo para um ambiente digital?

No caso do exemplo que aplicamos no Projeto SUPERTABi, o foco não está e nunca pode estar apenas na dimensão tecnológica, porque não se trata de colocar tablets nas mãos das crianças, mas sim, dar ferramentas pedagógicas aos professores e criar um ambiente de cidadania (hoje inclui o digital, obviamente) para que se criem desafios e atividades que, naturalmente, façam emergir a tecnologia nas atividades diárias. Não podemos continuar a fazer o que vemos na grande generalidade das práticas curriculares, lecionar o currículo sem percebermos se os alunos o aprendem e, para que isso aconteça, o foco não deve estar em mais ferramentas digitais, mas redefinir o que os alunos podem fazer com as mesmas. Não me parece que essa alteração esteja a acontecer, apenas estamos a verificar uma aprendizagem técnica do uso da tecnologia, os professores estão a dominar tecnicamente e a ganhar competências técnicas, mas quando continuam a fazer o mesmo exercício no digital, que antes era feito em papel, apenas alteraram o formato… é preciso colocar os alunos a produzir e a criar, usar a multimédia para produzirem conceitos, trabalhando a tutoria entre pares e, nesta fase, a aprendizagem invertida, que é claramente um modelo que mais se adequa nesta fase.

 De que forma este projeto poderá ajudar a mudar o papel do professor no ambiente educativo mais exigente que se vive?

Este projeto já redefiniu novas forma de ensinar e aprender e estes professores confessam que não sabem já ensinar de outra forma e não mais regressam à forma como o faziam. O professor de hoje não pode ser mais um transmissor de conhecimento, uma vez que a informação pode ser consultada a qualquer hora e qualquer lugar, por isso o tipo de trabalho deve ser de facilitador e orientador, ajudando os alunos a filtrar o que encontram ao invés de lhes transmitirem a informação.

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